quinta-feira, abril 18, 2024
Nacional

Professor Pasquale: ‘o dicionário é o grande cartório da língua’

“Inculta e Bela”. Foi no trecho do poema de Olavo Bilac que o professor Pasquale Cipro Neto encontrou a melhor forma para definir a língua portuguesa. Ele se dedica à área desde 1975, ministrando palestras pelo país inteiro. Quem o vê na televisão, durante o programa Nossa Língua Portuguesa, sabe muito bem que seu trabalho não se limita apenas a esta mídia e que ele é um professor multimídia: atua como colunista dos jornais Folha de S. Paulo, O Globo, Diário do Grande ABC e na revista literária Cult. Isto sem falar nos inúmeros livros já publicados sobre a língua portuguesa. Foi na noite de ontem que Pasquale escolheu como “sala de aula” o Senac de Piracicaba, numa palestra para convidados da instituição. Antes, no entanto, arrumou tempo para bate-papo em tom informal e descontraído com A Tribuna Piracicabana.

 

COMO O SENHOR AVALIA A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE PORTUGUÊS NO PAÍS?

Olha, o Brasil é muito grande, é muito difícil falar de uma maneira mais ampla. São casos e casos. Ainda existe gente trabalhando com os velhos métodos, gente que reforça o que Drummond diz num poema chamado “Aula de Português”. Ele diz: “O português são dois. O outro, mistérios”. O poema deixa claro que o outro português é o da sala de aula e esses mistérios são aquelas coisas que, né. (Pausa). O professor de português precisa transformar o ensino dele em algo concreto, em algo que se refira ao texto, que ajude o aluno a compreender e produzir um texto. Muita gente ainda não faz isto, mas muita gente já faz e usa a gramática como instrumento, um meio e não como um fim. A gramática pela gramática não leva a absolutamente nada. Tem de tudo, desde a ponta esquerda até a ponta direita e o meio e tudo mais.

 

E SUA VISÃO SOBRE O PAPEL DA TELEVISÃO NO APRENDIZADO À DISTÂNCIA?

Como instrumento auxiliar, sem dúvida nenhuma, é um papel muito bom e importante. Como substituto do professor é impensável. A televisão pode muito bem funcionar como um elemento assessório e auxiliar, não como um elemento único e principal.

 

FALAR O PORTUGUÊS CORRETAMENTE NO DIA A DIA É DIFÍCIL?

Eu acho que a questão é outra. As pessoas precisam ter com a língua a mesma relação que elas têm com a roupa. Assim como tudo mundo tem, teoricamente, um guarda-roupas variado, teoricamente, dependendo das situações sociais de que participa, precisa de diferentes formas de linguagem. As pessoas deveriam ter um guarda-roupas lingüístico semelhante e, obviamente, faria parte deste guarda-roupas a língua do dia-a-dia, é obvio, uma coisa já natural, mas também fariam parte as variedades formais, que as pessoas precisam dominar para ler e produzir determinados textos, não para usar esta variedade a todo instante. A gente não vai à praia de terno nem vai ao tribunal de sunga.

 

E QUAL A DIFICULDADE MAIOR NESSE PROCESSO DE APRENDIZADO?

Eu diria que esta dificuldade não se restringe à questão da língua e sim a todo o aprendizado. É o pensamento. É preciso trabalhar o pensamento, o raciocínio. O professor tem que ser um elo fundamental nessa corrente, para que o aluno seja estimulado a raciocinar. A escola “decoreba” precisa ser abominada, precisa ser repugnada. As pessoas precisam entender os processos.

 

O QUE VOCÊ ACHA DOS ESTRANGEIRISMOS PRESENTES EM NOSSA LÍNGUA?

Se usados com bom senso, quando eles preenchem os espaços vagos na língua, os chamados empréstimos, que são naturais, sem problema. O problema é usar o estrangeirismo de modo idiota. Agora eu acho que é errado usar este vocabulário como instrumento de exibição de falso conhecimento, de falsa superioridade e de falso elitismo. Usar termos estrangeiros no lugar de termos muito mais conhecidos é um negócio que não tem fundamento. O estrangeirismo não precisa ser regulamentado por lei, mas pelo bom Senso. Vou dar um exemplo: o sujeito que foi numa loja e na fachada estava escrito “50% off”, ele não precisa de lei, mas de vergonha na cara. Ele é bobo e precisa deixar de ser bobo. Ninguém sabe o que é 50% off.

 

MAS VOCÊ DEFENDE A INCLUSÃO DE ESTRANGEIRISMOS EM NOSSOS DICIONÁRIOS? E AÍ?

Somente a partir do momento em que o estrangeirismo entra de fato no uso. Mas isso se regula com o tempo também. Não adianta ter vida, estar em uso e depois sumir. Aí constitui modismo e não fato cabal da língua. O dicionário é o grande cartório da língua. Aquela bobagem que de vez em quando a gente ouve, que o pessoal preocupado com o politicamente correto fala que não pode botar certas palavras com certas definições, eu sou contra e acho que tem que pôr sim. Aquilo não é o dicionarista que está dizendo, ele é apenas o cartório e registra o que se usa. Se ele fizer o contrário, aí sim ele estará discriminando. Se é uso, ele que ponha e diga que uso é.

 

MÚSICAS E POESIAS SÃO USADAS COMO EXEMPLOS PARA AS REGRAS DE PORTUGUÊS DURANTE O SEU PROGRAMA? A PESSOA APRENDE MAIS FÁCIL COM TAIS MÉTODOS?

A idéia de fazer isto é pura e simplesmente para mostrar que o ensino de língua não deve se basear só nos textos clássicos. Mas é claro que os textos clássicos devem fazer parte do contato com a língua, mas existem outras manifestações, como é caso da música popular brasileira, da poesia, do texto jornalístico, da propaganda. E tem que mostrar isto para as pessoas. Não é possível trabalhar com uma só vertente, até mesmo porque ninguém nasce só para ler editorial de jornal ou só para escrever contato de locação ou ainda só para ler livro sobre direito e mecânica quântica. As pessoas precisam ler tudo, elas precisam de um preparo para dominar várias linguagens.

 

EXISTE FÓRMULA PARA UM BOM TEXTO?

Essa fórmula está perdida por aí (risos). Há um conjunto de fatores que ajudam: ler, ter contato com os textos ou tentar escrever. Eu não conheço alguém que tenha aprendido a nadar a seco. Não existe uma escola de natação sem piscina, ou seja, quem não escreve não vai escrever mesmo. É preciso tentar, ter contato.

 

E ESTA DICA SE ESTENDE AO ALUNO QUE ESTÁ SE PREPARANDO PARA O VESTIBULAR E PRECISA CAPRICHAR NA REDAÇÃO?

Sem dúvida! Ele precisa ter opinião própria, não pode ir na dos outros e não pode ser um repetidor. É preciso ainda ter domínio da linguagem culta, porque a redação de vestibular é escrita neste padrão de língua. O aluno precisa ter raciocínio lógico, ou seja, não pode juntar as idéias “tortamente” e não pode criar relações que não existem. É um exercício constante.

 

O BRASILEIRO SE PREOCUPA EM FALAR E ESCREVER BEM?

Olha, é difícil responder. Eu acho que o meu trabalho, se isto serve de referencial, desperta um grande interesse nas pessoas e isto é sinal de que elas têm vontade de mergulhar no universo que vai além daquilo que elas já sabem. O professor de português não existe para dizer às pessoas aquilo que elas já sabem. As pessoas têm uma linguagem vivíssima, ativíssima. As pessoas falam no dia a dia. Elas resolvem os seus problemas do cotidiano com a linguagem que conhecem e que dominam, mas elas querem dominar outras linguagens. É como me disse um dia um rapper: “a gente também quer dominar a língua do doutor”.

PRA FINALIZAR, QUAL A SUA AVALIAÇÃO DO PORTUGUÊS NO JORNALISMO ATUAL?

De novo, há de tudo. Há aberrações e há textos bem escritos. O jornalismo é um caso à parte. É um incêndio constante. O jornalista tem cinco minutos, dez, meia hora para escrever. E, às vezes, o texto fica pronto e é derrubado. E tem aquela coisa de caber na página. É preciso dar um desconto. Uma das grandes armas para que o texto seja perfeito é o tempo. Quando lê o jornal, o leitor deve ter um belo filtro e um belo potencial para saber se existe competência ou se acontece o contrário na notícia apresentada. Uma questão é certa: Não existe texto perfeito.

Espalhe por aí

Publicada em junho de 2004, no Jornal A Tribuna Piracicabana

Postado por Marta Aguiar

 

Marta Aguiar

Eu, Marta Rodrigues de Aguiar nasci em: 27/08/1958, sou funcionária pública, fui a primeira presidente do Conselho de Turismo, sou escritora e acadêmica da (ACLA), Academia de Ciências Letras e Artes de Manhuaçu-MG, Possuo cursos de Organização de Eventos, Secretariado Executivo, Informática, Designer Gráfico, (CorelDraw e PhotoShop), Cursando mais uma vez Designer Gráfico na Prepara com mais duas especializações. (CorewDraw, PhotoShop, PageMaker e InDesigner). Sou Repórter e Fotógrafo, trabalhei com Devair Guimarães no Jornal das Montanhas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *